- Enquanto a Arábia Saudita lidera os esforços do cartel ao reduzir significativamente sua produção e aumentar preços, outros membros podem estar reconsiderando sua adesão por não quererem ser limitados;
- À medida que grandes e novos produtores de fora do cartel aumentaram sua produção de petróleo, a aliança tem perdido influência, enfraquecendo o cartel;
- O futuro da OPEP, historicamente uma peça central no mercado energético, está diante de importantes transformações, como maiores demandas por fontes mais sustentáveis.
O cenário global de produção de petróleo enfrenta uma encruzilhada crucial com a notável decisão da Angola de deixar o Cartel de Petróleo OPEP.
A OPEP tem historicamente desempenhado um papel fundamental no controle dos preços do petróleo mantendo-os artificialmente altos, coordenando as políticas de produção de seus membros.
Contudo, a crescente produção de petróleo fora do cartel, liderada pelos Estados Unidos e outros novos players, tem desafiado sua influência. A recente saída da Angola sugere uma possível fissura na coesão interna da OPEP, levantando questões cruciais sobre seu futuro diante das transformações no mercado energético global.
O que é o cartel de produção de petróleo OPEP?
A OPEP, que significa Organização dos Países Exportadores de Petróleo, é um cartel formado por países produtores de petróleo que buscam coordenar e unificar suas políticas petrolíferas. Fundada em 1960, tem como objetivo teórico, de acordo com sua narrativa, de garantir a estabilidade nos preços do petróleo, coordenando as políticas de produção dos seus membros. Porém, na prática, o objetivo da OPEP é manter artificialmente altos preços do petróleo.
Os membros da OPEP são países que possuem grandes reservas de petróleo e desempenham um papel significativo no mercado global de energia. O cartel influencia os preços do petróleo controlando a produção e a oferta no mercado global.
Teoricamente, quando a demanda por petróleo aumenta, a OPEP pode decidir aumentar a produção para evitar uma disparada nos preços, porém, esse exemple quase nunca ocorre pois a OPEP está mais do que satisfeita em lucrar com os altos preços do petróleo.
Da mesma forma, quando há excesso de oferta e os preços estão baixos, a OPEP pode decidir reduzir a produção para equilibrar o mercado e manter os preços em níveis mais elevados. Esse cenário ocorre com muito mais frequência e vem sendo o status quo há muitas décadas, com poucas exceções como quando a Arábia Saudita em 2014 imundou o mercado com petróleo para tentar quebrar a nascente industria de fracking (petróleo de xisto) dos Estados Unidos.
O que é a OPEP+ “plus”?
A OPEP+ é uma aliança entre os membros da OPEP e alguns países que não fazem parte da aliança original. A colaboração entre o cartel e esses países não membros tem o objetivo de coordenar de uma forma mais efetiva as políticas de produção de petróleo e influenciar os preços no mercado global, já que quanto mais países aderirem às cotas de produção da OPEP, mais controle eles terão sobre os preços internacionais do barril de petróleo.
Ou seja, a ideia por trás da OPEP+ é que, ao unir forças, esses países podem ter um impacto mais significativo no equilíbrio entre oferta e demanda de petróleo.
A união com os países não-membros surgiu em resposta aos desafios enfrentados pelo mercado de petróleo, incluindo flutuações nos preços e mudanças nas dinâmicas de oferta e demanda.
Países que estão na OPEP+ e não fazem parte da OPEP são:
- Rússia
- Cazaquistão
- Azerbaijão
- México
- Malásia
- Sudão
- Sudão do Sul
- Omã
- Bahrain
- Brunei
O grupo realiza reuniões regulares para discutir e tomar decisões sobre os níveis de produção de petróleo, com o objetivo de controlar os preços e teoricamente evitar volatilidades excessivas. Porém na prática, essas reuniões envolvem acordos para cotas de produção dependendo das condições do mercado, para manter artificialmente os altos preços do petróleo.
Como a OPEP+ está artificialmente cortando a produção de petróleo para manter altos preços?
Em meio a uma paisagem de mudanças rápidas no mercado global de petróleo, a OPEP+ está implementando estratégias para manter os altos preços do petróleo, enquanto enfrenta desafios significativos, como a produção recorde dos EUA, Brasil e Guiana, que desafiaram seu domínio no mercado de petróleo.
Para combater a queda na participação de mercado, a OPEP+ adotou cortes artificiais ainda mais fortes na produção de petróleo, com o objetivo de impulsionar os preços e mante-los mais altos artificialmente.
Enquanto a Arábia Saudita lidera os esforços do cartel ao reduzir significativamente sua produção, outros membros podem estar reconsiderando sua adesão por não quererem ser limitados, como a Angola, que recentemente optou por deixar o cartel, buscando independência na gestão de sua produção de petróleo.
Como a OPEP está sendo enfraquecida por grandes e novos produtores de petróleo fora do cartel?
À medida que grandes e novos produtores de fora do cartel aumentaram sua produção de petróleo, a aliança tem perdido influência, enfraquecendo a OPEP. Algumas das razões são:
- Crescimento da Produção nos EUA e Canadá: Os avanços nas tecnologias de extração, especialmente no setor de xisto, permitiram que os Estados Unidos e o Canadá aumentassem significativamente sua produção de petróleo. Isso contribuiu para um aumento na oferta global, reduzindo a dependência de muitos países em relação aos membros da OPEP.
- Produção do Brasil e Guiana: A descoberta e o desenvolvimento de grandes reservas de petróleo no Brasil e na Guiana introduziram novos jogadores significativos no mercado global. O aumento da produção nesses países contribui para a diversificação da oferta e enfraquece a capacidade da OPEP de exercer controle exclusivo sobre a oferta de petróleo no mercado internacional e por consequência os preços.
- Novas Fronteiras na África e Suriname: A exploração e produção de petróleo em novas fronteiras, como alguns países africanos como Angola, Nigéria, Gana, Senegal e Namíbia e potencialmente no futuro o país sul-americano Suriname, aumentaram a oferta global. Essas novas fontes de produção representam desafios adicionais para a OPEP, à medida que a competição no mercado global se intensifica.
- Maior Diversificação Geográfica: A presença de produtores de petróleo em várias partes do mundo, fora da influência direta da OPEP, contribui para uma maior diversificação geográfica da produção global. Isso reduz a vulnerabilidade a interrupções em uma região específica e proporciona uma distribuição mais ampla da oferta.
Em consequência desses fatores combinados, alterações nas dinâmicas de poder acontecem à medida que a produção fora da OPEP aumenta, deslocando o equilíbrio de influência no mercado global de petróleo.
Dessa forma, observa-se que a OPEP já não detém mais o monopólio do controle sobre os preços e as condições do mercado, uma vez que novos participantes desempenham um papel significativo nas negociações e decisões que impactam a indústria petrolífera.
Até mesmo sua capacidade de influenciar os preços através de cortes de produção tem sido limitada pelos esforços de outros produtores em todo o mundo para aumentar ou manter sua produção, muitas vezes buscando objetivos econômicos e estratégicos próprios.
Os EUA batendo record mundial histórico na produção de petróleo e a Angola saindo do cartel
Enquanto os Estados Unidos estão no caminho de aumentar sua oferta em 1,4 milhão de barris por dia, um número mundial histórico, a OPEP+ planeja uma redução de 400.000 barris por dia para o início de 2024. Essa disparidade de direções cria um campo de batalha mais acirrado na luta da OPEP de manter os altos preços globais do petróleo.
Os EUA emergiu como um líder, atingindo uma produção recorde de petróleo bruto, impulsionada por avanços tecnológicos na extração de óleo de xisto. Esses desenvolvimentos posicionam os EUA como o maior produtor mundial de petróleo alcançando níveis recordes, marcando uma transformação nas dinâmicas do mercado.
Ao mesmo tempo, a decisão da Angola de deixar a OPEP aponta para mudanças estratégicas em curso. A saída do cartel oferece a Angola uma flexibilidade renovada em suas políticas de produção, permitindo que o país busque um impulso econômico a partir da exportação de petróleo, bem como alianças alternativas e acordos bilaterais.
Outros países africanos que atualmente integram a OPEP são a Argélia, a Guiné Equatorial, o Gabão, a Líbia, a Nigéria e a República do Congo. No entanto, assim como Angola, nações como a Nigéria, Gana e Gabão, que almejavam uma significativa expansão na produção para 2024, podem eventualmente seguir o exemplo de Angola e optar por deixar a OPEP.
Isso devido à frustração decorrente das restrições impostas pela Arábia Saudita na produção de petróleo desses países, visto que esses países precisam de recursos para investir em seus respectivos países em áreas como educação e infraestrutura.
Por outro lado, a China – como um dos maiores consumidores globais de petróleo – também se torna um elemento crítico nesse cenário. A desaceleração da economia chinesa pode ter implicações significativas na demanda global por petróleo, impactando os preços e as perspectivas do mercado.
Além disso, as pressões crescentes em direção a políticas climáticas e a ascensão dos veículos elétricos (EVs) estão redefinindo o panorama energético. As iniciativas globais para transições mais sustentáveis estão alterando as projeções de demanda por petróleo, adicionando uma camada adicional de complexidade às dinâmicas do mercado.
Portanto, o aumento da produção nos EUA, a saída da Angola, a insatisfação de alguns países africanos com as limitações impostas pela Arábia Saudita ao cartel, a desaceleração da economia chinesa, bem como a crescente demanda por veículos elétricos não apenas desafiam as estratégias da OPEP, mas também ressaltam as crescentes mudanças no mercado do petróleo.
Qual o futuro da OPEP e seu imensurável poder no mercado mais importante de energia mundial
O futuro da OPEP, historicamente uma peça central no mercado global de energia, está diante de importantes transformações neste mercado. Conhecida por sua influência na regulação da produção de petróleo e na manutenção de altos preços, o cartel está enfrentando crescentes pressões que podem impactar seu poder de influência.
O nível do poder e influência da OPEP dependerá de sua capacidade de lidar com uma série de fatores que estão fora do seu controle. A decisão da Angola de sair do cartel sinaliza uma fissura potencial, indicando que outros países podem seguir o mesmo caminho, enfraquecendo a coesão interna da organização.
A guerra de preços de 2014, desencadeada pela Arábia Saudita que inundou o mercado de petróleo para tentar matar a recente industria de xisto nos Estados Unidos, e que acabou fracassando a um custo bilionário para o Reino Saudita, demonstrou a vulnerabilidade da organização diante de mudanças na dinâmica do mercado.
Uma opção é que a Arábia Saudita inunde novamente o mercado de petróleo para despencar o preço do barril e assim tentar uma vez mais quebrar os produtores americanos que têm um custo de extração bem acima do que de Riyadh.
Outra opção, é que a OPEP deva manter sua importância nas próximas décadas, no entanto é inevitável que ela perca parte de sua influência à medida que mais países buscam autonomia em sua produção de energia, a chamada “soberania energética,” que muitos países buscam.
A 28ª Conferência das Partes (COP 28) em 2023 destacou a urgência de explorar alternativas e se adaptar a um cenário em evolução, portanto é possível que a Arábia Saudita busque copiar os esforços dos Emirados Árabes Unidos em criar novas fontes de receita além do petróleo, o que seria parte do seu plano de transformar o país em uma “nova Dubai”.
Independe das decisões do cartel, as políticas climáticas globais e a busca por fontes de energia mais sustentáveis estão moldando um novo mercado. Com a redução da dependência de combustíveis fósseis, a demanda por petróleo pode diminuir, impactando diretamente os interesses da OPEP.
Dessa forma, a incerteza paira sobre o impacto a longo prazo dessas estratégias. A OPEP+ continuará sendo uma força dominante no mercado de petróleo, porém ela eventualmente perderá terreno para os crescentes produtores fora do cartel e para o maior uso de energia renováveis.
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