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Como as Últimas Ameaças Russas Conseguiram Fortalecer uma OTAN que Estava Enfraquecida

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) está protagonizando cada vez mais as mediações dos conflitos entre a Rússia e a Ucrânia, reafirmando o seu papel nos conflitos geopolíticos dentro da Europa e sua vizinhança.

O presidente russo Vladimir Putin possui um grande objetivo de diminuir a participação do Ocidente na Europa, principalmente dos Estados Unidos e assim refazer a sua esfera de influência na mesma.

Porém a OTAN está tornando-se cada vez mais essencial na defesa dos seus membros e aliados, tanto que o agravamento das ameaças e tensões do avanço russo vêm aumentando o interesse de novas alianças à Organização.

Após um período de queda de protagonismo, desde a queda do muro de Berlim, a OTAN estava encontrando ainda seu papel no cenário geopolítico. Paul Taylor analisou à Politico as relações entre a OTAN, seu ressurgimento e os conflitos russos: 

“O resultado final do comportamento ameaçador da Rússia será, claramente, aumentar a presença militar da OTAN nos antigos satélites da Europa Oriental de Moscou, e não remover as forças ocidentais desses países, como Putin exigiu”.

Paul Taylor, Politico

Fonte: Pixabay

O que é a OTAN

Criada em 1949, a Organização do Tratado do Atlântico Norte é uma aliança de vários países do Ocidente como: Bélgica, Canadá, Estados Unidos (líder da facto do Tratado), França, Itália, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Portugal, Reino Unido e mais 20 outros Estados Membros. 

Seu grande objetivo de criação foi uma aliança de defesa mútua entre os países membros. Foi na Guerra Fria que seus princípios realmente foram se refinando, e com a Queda do Muro de Berlim concretizou a sua primeira intervenção militar na Bósnia em 1992.

Os fundamentos da aliança se dão em quatro objetivos específicos:

  • Uma aliança política e militar
    • Política: “A OTAN promove valores democráticos e promove entre os seus membros a consulta e a cooperação em matérias relacionadas com a defesa e segurança com vista a resolver problemas, desenvolver confiança e, a longo prazo, evitar conflitos.”
    • Militar: “A OTAN está empenhada na resolução pacífica de litígios. Caso os esforços diplomáticos falhem, a OTAN conta com poder militar para realizar operações de gestão de crises. Estas são realizadas no âmbito da cláusula de defesa coletiva do tratado de fundação da OTAN – Artigo 5º […]”
  • Defesa Coletiva
    • “A OTAN pauta-se pelo princípio de que um ataque contra um ou mais dos seus membros é considerado um ataque contra todos. Este é o princípio de defesa coletiva consagrado no Artigo 5º do Tratado de Washington. Até hoje, o Artigo 5º foi invocado apenas uma vez – em resposta aos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos.”
  • A Ligação Transatlântica
    • “A OTAN é uma aliança de países da Europa e da América do Norte. Esta proporciona uma ligação exclusiva entre estes dois continentes, permitindo-lhes a consulta e a cooperação nas áreas da defesa e da segurança, bem como a realização conjunta de operações multinacionais de gestão de crises.”
  • O conceito estratégico de 2010
    • “Os Conceitos Estratégicos estabelecem as tarefas e princípios fundamentais da Aliança, os seus valores, o ambiente de segurança em evolução e os objetivos estratégicos da Aliança para a próxima década. O Conceito Estratégico de 2010 define tarefas fundamentais da OTAN como, por exemplo: defesa coletiva, gestão de crises e segurança cooperativa.”

O principal valor de participar da OTAN se dá no compromisso de defesa mútua do Artigo 4° e 5°, que assegura a liberdade de soberania nacional dos Estados e que todos devem se comprometer a proteger seus aliados caso estejam sob ameaça.

Por que a OTAN estava se enfraquecendo e sem uma “missão”

A OTAN apoiou em parte os Estados Unidos em sua “Guerra Contra o Terror,” principalmente no Afeganistão mas também em outros conflitos como na Líbia. Porém, essas participações em diferentes conflitos estava longe da missão original da OTAN de defender o Ocidente contra a expansão do Comunismo via a União Soviética.

Por exemplo, em Novembro de 2019 o presidente francês Emmanuel Macron declarou que a OTAN passava por uma “morte cerebral” e que a União Europeia tinha que se fortalecer militarmente independente da OTAN em sua autonomia estratégica de defesa.

“Vamos encarar a realidade. Você tem parceiros na mesma área geográfica e você não tem qualquer coordenação sobre a tomada de decisões estratégicas dos Estados Unidos com parceiros da OTAN”, acrescentou [Macron], aparentemente referindo-se à retirada dos EUA da Síria e a recente invasão da Turquia do mesmo país.

Politico

Os compromissos militares da OTAN estavam sendo utilizados principalmente para os interesses dos Estados Unidos, nas suas missões e nos seus objetivos, que por vezes não eram os mesmos que dos outros estados membros.

A Aliança não estava sendo utilizada em seus fundamentos essenciais, mas sim como ponte comercial e uma forma de compromisso estável entre os países. A concretização desse compromisso não estava sendo realizada, e por isso a OTAN estava decaindo em seu protagonismo das questões de defesa.

Trump vê a OTAN “como um projeto comercial”, disse Macron. “Para ele é um projeto onde os E.U. fornecem um guarda-chuva geopolítico, mas em troca, eles querem exclusividade comercial, é uma razão para comprar americano. A França não assinou isto.”

Politico

Depois de ser vista com uma “Morte Cerebral” por Macron, a OTAN está renascendo graças a Putin

Após os conflitos se agravarem e com aumento da tensão entre a Rússia e a Ucrânia, nos últimos meses, a OTAN começou a construir uma “nova missão” e papel.

O Kremlin é muito explícito com relação aos seus pensamentos sobre o avanço da OTAN, liderada pelos EUA, e da União Europeia no flanco Leste. Com um objetivo de reatar relações com as ex-repúblicas socialistas, Putin está no momento em busca do fortalecimento da esfera de influência russa.

Porém, esses antigos países satélites que estão sob ameaça do avanço russo sentem a vulnerabilidade do momento em que se encontram. Com isso, a participação como membro da OTAN enquanto aliança militar e política ganhou valor novamente e os países voltaram a buscar o compromisso com a aliança.

Desde o anexação da Crimeia em 2014, Putin demonstrou o poder militar que a Rússia vinha construindo.

Ao mesmo tempo, os Estados Unidos estavam com um enfoque maior na oposição que a China simboliza a nação e a União Europeia estava em busca de uma maior autonomia estratégica. Mas, os passos que a Rússia está tomando na Europa reacenderam a necessidade dos serviços de defesa mútua que a OTAN presta.

Neste momento, não somente os laços da OTAN com os países europeus se aprofundou, mas também a participação mais ativa dos EUA na região.

Por exemplo, só em Janeiro de 2022, várias notícias mostraram o fortalecimento da OTAN com o comprometimento de seus membros e aliados:

  • a Suécia e a Finlândia, que fazem parte da UE mas não da OTAN, sentiram a ameaça russa e reafirmaram a liberdade que têm, caso queiram se unir à OTAN em um futuro próximo;
  • a Espanha enviou um fragata para o Mar Negro;
  • a Reino Unido mandou mais tropas para os países Bálticos e Polônia;
  • a França se comprometeu a enviar tropas para a Romênia se necessário;
  • a Dinamarca enviou caças F16 e a Holanda caças F35 para o flanco leste da Europa;
  • os EUA deixaram 8.500 soldados em alerta para serem enviando para região em caso de conflito.

Ou seja, o grande objetivo de Putin de diminuir a hegemonia americana no Leste Europeu saiu pela culatra, já que a presença da OTAN nos ex-estados soviéticos não será mais amena e sim seguirá as táticas da Guerra Fria novamente: “avanço e defesa”.

Como bem colocado por Paul Taylor para o Politico: “Putin pode carregar uma grande bazuca, mas parece que aponta para o seu próprio pé.”

10 Comments

  1. Lucas Lucas 23 de February de 2022

    Olá! Obrigada pelo artigo. Será que a Rússia vai invadir a Ucrânia?

    • Redação Redação 24 de February de 2022

      Obrigado Lucas!

      Essa é a resposta de 1 milhão de dólares. TODOS os analistas de inteligência do mundo estão atrás dessa resposta e não têm. Acho que uma coisa é certa. O Putin só entende o jogo da força. Ele testou o Obama na Síria e o Obama recuou. O Putin viu isso como fraqueza e fez o que quis na Síria. Agora o Putin está testando o Biden (que era vice do Obama) e a OTAN. Ele acha que em geral os democratas são mais fracos e que também recuariam e feriam concessões à Rússia (o que seria um sinal gigante de fraqueza). Só que a OTAN não recuou 1 milímetro, inclusive de uniu e se fortaleceu ainda mais (https://atlasreport.com.br/como-as-ultimas-ameacas-russas-conseguiram-fortalecer-uma-otan-que-estava-enfraquecida/).

      Só que agora o Putin se colocou em uma sinuca de bico. Se recuar, vai demonstrar fraqueza, se atacar, vai vencer a Ucrânia momentaneamente, vai se colocar em um lamaçal gigantesco militarmente e economicamente com perdas gigantes no 2 campos….inclusive correndo um risco de sofrer um golpe de estado interno se os oligarcas bilionários decidirem que estão se ferrando demais e têm que tirar o Putin para não perderem tudo.

      A única alternativa seria tirar as tropas e dizer “olha, não falei que era tudo exercício, esses Americanos que só pensam em guerra!” Nós somos bonzinhos. Mas aí no fundo ele saberia que teria perdido geopoliticamente para os EUA/OTAN pois blefou, e não caíram no seu blefe. Tem que ficar de olho em Donbass, o gatilho (desculpa falsa) para o possível conflito vai vir de lá.

  2. Gabriela Gabriela 24 de February de 2022

    Ótimo artigo! Quem está errado na disputa da Ucrânia? A Rússia, os EUA, ou os dois?

    • Redação Redação 24 de February de 2022

      Oi Grabriela. Obrigado pelo apoio!

      Não existe nenhum ator bonzinho em geopolítica. Mas eu não colocaria no mesmo nível os EUA e a Rússia. Com todos os defeitos dos EUA, inclusive usando “False Flag operations” para iniciar guerras pelo mundo, nem de perto se compara com as ações de desestabilização do regime Russo pelo mundo. Envenenando opositores com radiação em Londres e dentro de um avião, jogando outros pela janela, controlando protestos violentamente dentro da Rússia e apoiando o mesmo na Bielorrússia. Fora CONSTANTES ataques híbridos contra os 3 países Bálticos, a Suécia, a Finlândia, e a própria Ucrânia (https://atlasreport.com.br/guerra-hibrida-e-o-futuro-dos-conflitos-militares/). Tenho um amigo que é das forças especiais da Estônia. Ele me diz que o que a gente vê de ataque Russo híbrido não é nem 10% do que ocorre de verdade.

      Quanto a Ucrânia, dá para ver o conflito do ângulo de vários atores. Da Rússia, dá para dizer que “é direito dela de manter sua ESFERA de INFLUÊNCIA” Escrevi sobre isso também….https://atlasreport.com.br/o-que-e-a-esfera-de-influencia-que-a-russia-quer-manter-na-europa-oriental-e-caucaso/

      Da Ucrânia, eu pessoalmente acho completamente justo que um país tenha soberania o suficiente para decidir com quem quer se alinhar. E se a esmagadora maioria da Ucrânia (inclusive muitos de etnia Russa) quer se alinhar com o ocidente fazendo parte da UE e da OTAN, é direito deles. Mais de 1 milhão de Ucranianos já migraram para Polônia.

      Mas tudo é questão de poder. Se infelizmente eles não tem poder militar suficiente para serem completamente independentes porque tem um vizinho muito mais forte que quer decidir por eles, paciência….mas com certeza não é algo considerado “justo” no sentido real da palavra.

      Quanto ao EUA/OTAN, a Europa foi o continente onde mais houve conflitos na história da humanidade. 2 Guerras Mundiais começaram lá. Ter agora esse conflito gigantesco dentro da Europa mudando fronteiras pode desencadear uma sequencia de eventos que pode levar todo o continente a uma guerra. E aí a “Ordem Liberal Mundial” que existe desde a segunda guerra e que foi construída e sustentada pelos EUA já era. Esquece a ONU, esquece regras e lei internacional, esquece tudo. Vai ser anarquia e a lei do mais forte com um monte de país maior invadindo países menores, e ninguém fazendo nada para impedir isso. Quer queira quer não, os EUA são “de facto” a polícia do mundo, e vivemos em um mundo relativamente pacífico em termos históricos por causa dos EUA.

  3. Lucio Lucio 25 de February de 2022

    Boa tarde,
    E a China nessa história com a Ucrânia? Só vendo tudo de camarote ou você visualiza “alguma participação”?

    • Redação Redação 25 de February de 2022

      Oi Lucio!

      A China sobretudo quer ver a reação Americana/OTAN. Se eles afinarem, vai ser um convite para ela invadir Taiwan. Se os Americanos/OTAN não fizerem concessões e ainda apoiarem militarmente a Ucrânia (não com soldados, mas armamento e dinheiro), aí a China vai pensar 2 vezes antes de invadir Taiwan. Além disso, Taiwan é MUITO mais importante para segurança nacional americana do que a Ucrânia pois é o maior produtor de microchips do mundo. Se a China ocupar Taiwan, vai dominar mais de 50% da produção de semicondutores do mundo, o “petróleo do século XXI” e os EUA não deixariam isso acontecer. Mas se afinarem na Europa, transmitiriam uma fraqueza que pode incentivar a China a atacar. https://atlasreport.com.br/por-que-os-eua-defenderiam-taiwan-contra-a-china-microchips/

      Em relação ao conflito em si se acontecer, a China deve apoiar a Rússia financeiramente, já que a Rússia provavelmente seria expulsa do sistema SWIFT e de negociações com dólares (ou até euros) e também apoiariam comprando muito gás russo, já que a Rússia provavelmente fecharia as torneiras para Europa e assim perderia muita receita. Mas não vejo a China se envolvendo muito mais do que isso no conflito. Em geral, não é estratégia deles ficar se envolvendo muito em conflitos geopolíticos que não aconteçam na sua área de influência regional mais próxima. Além disso, a China tem investido muito na Ucrânia e é hoje o maior parceiro comercial de Kiev. Sendo assim, a China não ficaria muito satisfeita se um conflito com a Rússia afetasse esses investimentos. Mais uma razão para não apoiar abertamente a Rússia.

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