A União Europeia vem investindo em seu desenvolvimento enquanto uma unidade de diversos países, e isso inclui avanços nas suas tecnologias e fornecedores para que consiga alcançar uma maior independência estratégica e assim participação política ainda mais ativa no cenário internacional.
As relações econômicas e políticas com a Rússia estão cada vez mais tensas, principalmente com a tentativa russa de avançar na Ucrânia desde a sua conquista da Crimeia em 2014. Porém, a Rússia continua sendo a maior exportadora de gás natural para a Europa, o que lhe dá mais liberdade de coagir a UE a seguir seus interesses.
Com esse contexto, há uma busca de diversificação da União Europeia com seus fornecedores de gás, principalmente buscando novas alianças no Oriente Médio e Norte da África, e a criação de novos gasodutos para suprir a demando de sua população e empresas. É a busca pela chamada “soberania energética” e um dos pilares da “soberania estratégica” que busca a UE.
Por que a União Europeia é tão dependente do gás Russo para energia
A Rússia é o maior fornecedor de gás natural da União Europeia, com diversas linhas de gasodutos pela Europa.
A grande dependência da UE com o uso de gás se dá por conta do seu uso na produção de energia elétrica e aquecimento, sendo cerca de 25% do uso bruto energético, principalmente na Alemanha, Itália e Reino Unido. A Rússia possui participação majoritária de um terço das importações de gás natural.
A hegemonia russa permite uma vantagem para o país, já que possui o controle sobre uma considerável parte do fornecimento de energia para a União Europeia. Isso restringe a liberdade que a UE possui para concretizar seus interesses, interesses esses que podem ir contra os objetivos da Rússia mas que não podem se realizar pelo receio de perderem a principal matéria prima energética.
E o Kremlin não possui problemas em relembrar essa insegurança e dependência, ameaçando sempre que lhe convém fechar as válvulas de fornecimento europeu.
A busca da UE por soberania energética
Desde 2010 há uma busca por planos de segurança, caso haja corte no fornecimento russo, por meio de um fortalecimento da integração energética interna europeia, aumentando as relações de solidariedade entre os Estados-membros, e externa com a renegociação dos Acordos Intergovernamentais (IGAs) para assegurar os contratos de soberania comercial europeia nos suprimentos de energia com países em desenvolvimento.
“Solidariedade significa que, em tempos difíceis, podemos enviar gás de um país para outro para assegurar fornecimento integral de gás às famílias, a prestadores de serviços sociais importantes como hospitais e a algumas centrais de gás para evitar cortes de energia”
Relator do Parlamento e Conselho, Jerzy Buzek (PPE, Polónia), UE
Além disso, a UE possui o objetivo de diversificação de fornecimento, buscando relações novas com atores do Oriente Médio e das regiões do Cáspio, para acabar com a dependência e as ilhas energéticas na Europa Central e Leste que por sua vez, dependem do gás russo.
Para isso, a União planeja construir novos gasodutos, como o Interconnector Turquia-Grécia–Itália (ITGI), o Nabucco e progresso do Trans-Anatolian Natural Gas Pipeline (TANAP) e South Stream. Além disso, a UE planeja aumentar suas relações com os EUA, a Austrália e o Leste da África para a importação do Gás Natural Líquido (GNL) via navios pelos portos no litoral europeu.
Este plano de ação busca, não só um maior desenvolvimento econômico e industrial, mas a segurança de soberania energética da União Europeia e sua autonomia estratégica no cenário geopolítico.
A controvérsia do “Nord Stream” ou Gasoduto europeu do Norte
A construção de novos dutos é o principal horizonte de independência para a UE, porém existem outros projetos com a Rússia que ainda são contestáveis e estão em discussão, como o Nord Stream entre a Rússia e a Alemanha.
O Nord Stream é um gasoduto já existente mas que está sob análise para seu aumento com mais dutos, o Nord Stream-2. Ele passa pelo Mar Báltico e é uma ligação direta entre a Rússia e a Alemanha, não passando por nenhum território de outro país.
Atualmente ele possui um fornecimento de 55 bilhões m3 anuais, podendo duplicar sua capacidade e chegar a 110 bilhões m3 anuais com o Nord Stream-2.
Porém, existem muitos países europeus e outros atores políticos (como os Estados Unidos) que observam um projeto desta magnitude como uma vantagem a mais para a Rússia e aprofundamento da dependência econômica da União Europeia.
A Ucrânia e Polônia são as principais críticas do projeto, já que a Ucrânia passa por relações tensas nas fronteiras com a Rússia, mas também porque ambas são países de passagem para gasodutos russos com destino à Alemanha. O projeto da Nord Stream vai contra seus interesses já que ligaria direto os dois países e perderiam os impostos cobrados para a passagem.
Na Autorização de Ato Fiscal do ano de 2020 dos Estados Unidos, sanções sobre a construção do gasodutos foram concretizadas, o que retardou sua concretização e o aval para a sua construção. Porém, em Maio de 2021, o governo de Joe Biden diminui essas sanções após acordo com a ex-chanceler Angela Merkel que continha limite de uso alemão do gás natural russo até 2024, um comprometimento em suporte com a Ucrânia para investimento (US$50 milhões) em energias sustentáveis como compensação a sua maior vulnerabilidade com a perda de taxações de trânsito do gás.
Desde então houve um grande avanço nas construções do projeto entre Julho a Setembro de 2021, esperando aval da União Europeia.
As relações da UE com a Alemanha ainda em mutação após a saída de Angela Merkel e a posse de Olaf Scholz. O primeiro ministro polonês Mateusz Morawiecki espera que o novo gestor alemão repense sobre os acordos com a Rússia:
“Falarei com o Chanceler Scholz para não ceder à pressão da Rússia e a não permitir que o Nord Stream 2 seja utilizado como um instrumento de chantagem contra a Ucrânia, um instrumento de chantagem contra a Polônia, um instrumento de chantagem contra a União Europeia”
Mateusz Morawiecki, 9 de Dezembro em 2021
Alternativas fora da Rússia para importação de gás pela União Europeia
As principais alternativas à Rússia para a diversificação da importação de gás da União Europeia são o Azerbaijão, Geórgia, Turquia, Chipre, Israel, Iraque, Líbia e Argélia.
- O Azerbaijão é o país com maior potencial de substituir o protagonismo russo no fornecimento de gás, já possuindo histórico de participação em novos projetos com a UE como o projeto petrolífero Azeri-Chirag-Deepwater Guneshli e projeto de condensação de gás Shah Deniz. Já está envolvido nos investimentos dos gasodutos Baku-Tbilisi-Ceyhan (BTC) e Baku-Tbilisi-Erzurum (BTE).
- Eles já concordaram, em 2014, em fornecer gás para o Trans-Adriatic Pipeline (TAP) que passará pela Turquia em destino à União Europeia. Além disso, é o país de origem do Trans-Anatolian Natural Gas Pipeline (TANAP).
- O TANAP é o principal projeto que envolve a Geórgia, já que sai do Azerbaijão e passa pelo país em destino a Europa. Chamado também de South Stream, o TANAP tem como rota o Mar Cáspio até o Sul da Europa na Itália, ligando o Gasoduto Caucasus do Sul com o TAP.
- A Turquia é um dos países de trânsito dos gasodutos, o que lhe garante um alto ganho de poder geopolítico neste acordo. Caso o plano do South Stream não se concretize, existem planos de concretizar um gasoduto próprio da Turquia ligando-se à Europa. Esse é um país chave para a diversificação da Europa, já que o Azerbaijão e a Rússia possuem relações comerciais, enquanto que os interesses turcos e da União Europeia estão completamente alinhados já que beneficia ambos.
- Chipre e Israel recentemente descobriram reservas de gás natural, ganhando o potencial de fornecimento e exportação para a UE. Porém, existem dois obstáculos nesses acordos: convencer o Chipre para que os gasodutos israelenses passem pela área de Exclusividade Econômica, o que permitiria uma influência ainda maior da UE sobre os países do Oriente Médio (principalmente a Turquia).
- O Irã, Iraque e Curdistão possuem reservas de petróleo e gás com potencial de exportação, mas os conflitos políticos dos países complicam o fechamento de acordos. As reaproximações entre o Governo Curdistão no Iraque com a Turquia são um avanço para concretizar os gasodutos no Norte do Iraque.
- A Argélia já foi o segundo maior fornecedor de gás natural da União Europeia, logo atrás da Rússia. Forneciam mais de 25 bi. m3 em gasodutos e 13.5 bi. m3 por GNL.Os acordos com a UE são uma busca de fortalecimento do mercado interno, principalmente nos setores de utilidade, dessalinização e industrial químico. Esses interesses particulares e internos limitam a ação europeia.
- A Líbia, assim como a Argélia, já possui relações de exportação de gás via Greenstream Pipeline para a Itália. Ao contrário do seu vizinho, a Líbia é um acordo muito mais estável já que seu mercado interno não está em grandes desenvolvimentos e dependem ainda da exportação pelos gasodutos ou GNL.
Além desses países, Bruxelas possui fornecimento de gás da Noruega, Nigéria, Qatar e Estados Unidos pela forma de GNL. Há o investimento, que conta principalmente com o apoio dos EUA, para a construção de mais portos no litoral europeu para que a dependência com a Rússia seja extinguida.
Lista de projetos e gasodutos nos países e importação de GNL
- Trans Adriatic Pipeline (TAP)
Projetado em 2003 e construído em 2016, o TAP iniciou seu funcionamento em 2020 e liga o Azerbaijão com a Itália. Ele passa pela região do Mar Cáspio pela Grécia e Albânia, originado no campo de Shah Deniz e transitando pelo Gasoduto Caucasus Sul e TANAP até chegar na Europa. Faz parte do chamado “Projeto de Interesse Comum” das instituições da União Europeia em busca por segurança energética.
- Trans-Anatolian Natural Gas Pipeline (TANAP)
Localizado principalmente na Turquia, o TANAP faz parto do Corredor de Gasodutos do Sul (South Stream Pipelines) e conecta o Caucasus Sul com o TAP. Possui 1841 km, foi projetado em 2015 e inaugurado em 2018. Permite as exportações de gás do Azerbaijão para a Europa e reforça também o papel da Turquia como ator regional principal no campo de energia.
- Interconnector Turquia–Grécia–Itália (ITGI)
É um projeto de extensão do gasoduto já existente entre a Turquia e a Grécia, de 2007, com a construção da ligação entre Grécia e Itália. Sua concretização, contudo, não possui prazo definido já que compete com o fornecimento do TAP e do gasoduto entre Grécia-Bulgária. Este projeto possui implicações diplomáticas e comerciais que ainda estão em discussão.
- Gasoduto de Nabucco
Também conhecido como gasoduto Turquia-Áustria, tinha objetivo de diversificar as rotas e os polos de recebimento de gás pela Europa. Contando com apoio de vários Estados-Membros e dos EUA, era uma forma de rivalizar com o contrato entre Itália-Rússia (projeto Gazprom-Eni South Stream) e diminuir a relação com o país. O fornecedor principal seria o Iraque, com potencial de adição do Azerbaijão, Turcomenistão e Egito. Porém, após a construção do TANAP, o projeto foi abortado em 2013 e engavetado.
- Portos de recebimento de GNL na União Europeia
Com o recebimento de importação de gás natural líquido, os portos de recebimento europeu devem passar pelo processo de gaseificação do líquido, para o transporte e uso interno. A condensação do gás é feito para que o transporte de áreas que não possuem ligação por gasodutos seja facilitada, além de possuir diversas vantagens:
- Garantia de diminuição nos níveis de emissão e isenção total de contaminantes após a queima;
- Possui queima uniforme, com grande eficiência e qualidade no processo de combustão;
- Menor custo em comparação a outros combustíveis líquidos do mercado, como diesel, álcool, gasolina e outros;
Os países que fornecem o GNL para União Europeia são EUA, Nigéria, Noruega, Rússia, Trindade e Tobago, Peru, Angola e Egito.
Os portos estão localizados em diversas cidades litorâneas de países como Portugal, Espanha, França, Itália, Bélgica, Alemanha, Grécia, Polônia, Lituânia e Bulgária.
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