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Como a Integração Econômica dos Países Turcos na Ásia Pode Levar a uma União Política e uma Mega Nação Turca Desafiando a China

  • A busca por uma maior integração entre os Estados turcos têm o potencial de reconfigurar a dinâmica de poder na Eurásia e influenciar as relações internacionais;
  • A Turquia tem desempenhado um papel central, navegando entre alianças e interesses estratégicos, enquanto outros atores globais observam de perto as mudanças em curso;
  • A maior integração dos países da OTS causa um impacto direto na influência chinesa na região. 

O fortalecimento da Organização dos Estados Túrquicos (OTS) por meio de uma maior integração econômica e política entre os Estados turcos tem o potencial de desempenhar um papel crucial no equilíbrio de poder na Ásia e no mundo. Essa iniciativa promove o fortalecimento da identidade turca, aumenta a representatividade internacional e impulsiona o desenvolvimento econômico regional.

Ao mesmo tempo, enfraquece o poder e a influência da Rússia e da China na região, oferecendo uma nova concorrência à ascensão chinesa. Essa transformação da OTS em um modelo semelhante à União Europeia, visando remover barreiras comerciais, simplificar sistemas aduaneiros e promover a livre circulação de bens, capital e pessoas, pode resultar em uma nova dinâmica geopolítica.

Com a OTS consolidando uma nova identidade turca e desafiando a influência de Pequim e Moscou, a região testemunha um processo de equilíbrio de poder e uma busca por autonomia geopolítica, moldando o futuro da Ásia e do mundo.

O Que é a Organização dos Estados Túrquicos e sua História

A Organização dos Estados Túrquicos (OTS) – anteriormente Conselho de Cooperação dos Estados de Língua Túrquicaé uma iniciativa de cooperação regional que visa promover a colaboração entre esses povos turcos.‌

O grupo é construído sobre quatro pilares principais: 

  • história comum; 
  • língua comum;
  • identidade comum; 
  • cultura comum.

Vale ressaltar que a iniciativa faz alusão a ideologia conhecida como Turan – ou até mesmo como pan-turquismo. A noção de Turan ecoa uma narrativa de solidariedade étnica e cultural, destacando a importância de uma herança comum e o desejo de fortalecer os laços entre os países turcos que estão situados, majoritariamente, na Ásia Central. 

Entretanto, o Conselho Turco não se limita a essas semelhanças. Em vez disso, visa ampliar as áreas de cooperação bilateral existentes, como economia, ciência, educação, transporte, comércio, turismo, entre outros setores.

A história da Organização de Estados Túrquicos remonta ao início dos anos 1990, quando os líderes do Azerbaijão, Cazaquistão, Quirguistão, Turcomenistão e Türkiye (novo nome oficial da Turquia) manifestaram interesse em estabelecer uma plataforma de cooperação para fortalecer as relações entre seus países. Em 1992, esses cinco Estados fundaram a organização em uma cúpula realizada em Ancara, capital da Turquia.

Inicialmente, além dos objetivos citados, o grupo tinha o objetivo principal de promover a independência dos Estados recém-criados após o colapso da União Soviética. Então, posteriormente, o Uzbequistão se juntou à organização em 1995.

Ao longo dos anos, a OTS ampliou suas áreas de cooperação para incluir assuntos como segurança, cultura, energia, meio ambiente e combate ao terrorismo, realizando cúpulas regulares e reuniões ministeriais para discutir questões de interesse mútuo e fortalecer a cooperação entre os Estados membros.

Em 2009, a OTS obteve o status de observador na Assembleia Geral das Nações Unidas, podendo assim, estabelecer parcerias com outras Organizações Internacionais e regionais para promover a cooperação e o diálogo em uma escala mais ampla.

Como a Guerra na Ucrânia acelerou a cooperação entre Estados Túrquicos

A invasão da Ucrânia pela Rússia gerou preocupações e instabilidades na região da Eurásia, levando nações com laços próximos à Rússia a buscar fortalecer sua colaboração entre si e para além de Moscou. 

Logo, como via de regra, os Estados Túrquicos intensificaram sua cooperação. A Turquia tem sido a força motriz por trás dessa cooperação, especialmente após o fortalecimento dos laços entre o partido no poder (AKP) e o partido nacionalista (MHP).

Além da história compartilhada, há outras razões pragmáticas para a cooperação entre os falantes de línguas turcas, como a disposição da Rússia em usar a força militar para dominar países anteriormente parte da União Soviética, como visto no caso da Geórgia em 2008 e da Ucrânia em 2022. 

É crucial para os povos turcos se dissociarem da Rússia para evitar uma imagem negativa e evitar uma influência excessiva da China. Os líderes turcos não querem ser vistos como aliados próximos da Rússia, visto que nenhum deles apoiou sua invasão à Ucrânia. 

Além disso, os governos da Ásia Central estão em busca de novos parceiros comerciais, uma vez que confiar na Rússia se tornou arriscado devido às restrições impostas pelo Ocidente.

Como uma maior integração econômica pode levar a uma maior integração política dos Estados Turcos no modelo da União Europeia

‌Na cúpula dos chefes de Estado que ocorreu em novembro de 2022 em Samarcanda, foram assinados acordos nos quais os Estados membros da OTS alcançaram um entendimento mútuo. 

Os líderes buscam transformar a organização em um modelo semelhante à União Europeia, no que pode se tornar a União Euroasiática,  removendo barreiras comerciais, simplificando sistemas aduaneiros e garantindo plena liberdade de transporte, circulação de capital e movimentação de pessoas com um entendimento estatal unificado.

No âmbito do “projeto Corredor Médio“, foram estabelecidas duas colaborações tripartidas separadas entre Turquia-Azerbaijão-Uzbequistão, com a participação dos ministros das Relações Exteriores, Comércio e Transporte, e entre Turquia-Azerbaijão-Cazaquistão, com ministros das Relações Exteriores e Transporte. Os ministros da Energia também planejam participar desses formatos tripartidos.

O Corredor Médio se estende de Türkiye à Geórgia, Azerbaijão e Mar Cáspio por meio de conexões ferroviárias e rodoviárias, e de lá segue para a China, passando pelo Turcomenistão-Uzbequistão-Quirguistão ou pela rota do Cazaquistão.

Ainda na cúpula, o presidente cazaque Kassym-Jomart Tokayev apresentou a estratégia de cinco anos da OTS para implementar o documento “Turkic World Vision 2040“, visando fortalecer a cooperação e a zona de estabilidade entre os estados membros. 

Ele propôs a criação de um “sistema de transporte digital” para otimizar o procedimento de liberação de carga e incentivar a entrada dos fornecedores no mercado internacional.

Outras propostas do presidente cazaque incluíram a criação de um Centro de Digitalização da OTS e um Fundo de Risco dos países turcos para impulsionar investimentos em projetos de inicialização e destacou a importância do desenvolvimento da economia verde e propôs a criação de um “Turkic Green Finance Council“.

Como um mega Estado unificado Turco pela Ásia pode ameaçar a influência Chinesa e Russa na região

O fortalecimento dos laços de cooperação entre os Estados turcos, consolidado na cúpula em Samarcanda, tem como um dos principais objetivos a criação de uma nova identidade turca e evitar a influência excessiva da China. 

Além disso, os líderes estão buscando alternativas ao domínio russo e mostram uma maior disposição para se aproximar uns dos outros. 

Ao fortalecer a Organização dos Estados Túrquicos, consequentemente haverá um contrabalanceamento da influência de Pequim e de Moscou na região, podendo até mesmo diminuí-las fortemente.

O presidente Tokayev, ressaltou ainda na cúpula a importância da OTS se tornar uma força poderosa e influente na resolução dos desafios regionais e globais. Ele enfatizou a necessidade de enfrentar juntos as contradições geopolíticas e geoeconômicas que prejudicam a economia e o sistema de transporte no continente eurasiano.

A competição entre as grandes potências internacionais traz consigo riscos e incertezas, mas também oferece oportunidades para o mundo turco aumentar sua influência global. Nesse contexto, a Turquia pode desempenhar um papel importante na resolução de problemas e acelerar o processo de integração, especialmente em meio às tensões entre o Ocidente, a Rússia e a China.

A importância da maior integração Turca para o equilíbrio de poder na Ásia e no mundo

O fortalecimento da OTS promove o equilíbrio de poder na Eurásia, permitindo que esses países atuem de forma mais coesa e influente. 

Essa integração fortalece a estabilidade dos países turcos, aumenta a representatividade internacional, impulsiona o desenvolvimento econômico regional e preserva a identidade cultural turca, desempenhando um papel fundamental na construção de um mundo multipolar.

Como resultado, a região testemunhará um enfraquecimento adicional do poder e influência da Rússia e dos países da CSTO – uma aliança militar semelhante à OTAN entre vários países da Ásia Central e da Eurásia –, que já sofreram perdas devido ao conflito na Ucrânia. Ao mesmo tempo, a ascensão da China na região será confrontada com uma nova concorrência, dada a conduta questionável da Rússia.

A Turquia, com sua abordagem pan-turquista e maior engajamento com os países da Ásia Central, está claramente estagnada em suas relações com a União Europeia. Especialmente com a recente vitória de Erdogan para seu terceiro mandato como presidente, reforçando sua política voltada para o Leste em lugar do Oeste. Isso afeta especialmente sua candidatura para aderir ao bloco europeu, que parece estar arquivada.

É importante destacar que a Turquia continua sendo um membro ativo da OTAN, apesar das tensões em suas relações com os Estados Unidos. Essa participação na OTAN pode resultar em uma convergência de alianças, trazendo benefícios tanto para os EUA, por meio da OTAN, quanto pela própria existência da OTS, que enfraquece o poder da Rússia e da China na região.

Nesse contexto, a presença da Turquia na OTAN cria uma dinâmica interessante, em que diferentes alianças e interesses estratégicos se entrelaçam.

Dessa forma, esses desenvolvimentos complexos têm o potencial de reconfigurar a dinâmica de poder na região e influenciar as relações internacionais. É um cenário em que a Turquia desempenha um papel central, navegando entre alianças e interesses estratégicos, enquanto outros atores globais observam de perto as mudanças em curso.

Dessa forma, a iniciativa da OTS reafirma a aspiração de unidade e progresso, abraçando a rica herança turca e canalizando-a para um futuro compartilhado, onde a cooperação e a solidariedade são os alicerces de uma parceria duradoura e desafiando a influência russa e chinesa na região.

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