- Este corredor é crucial para o transporte de mercadorias e pessoas, além de ser vital para a segurança nacional da Índia;
- A China tem aumentado sua presença militar perto do Corredor Siliguri, especialmente na região do Vale de Chumbi, no Tibete e Butão;
- Um conflito armado pode não apenas desestabilizar a região, mas também enfraquecer a posição global do BRICS.
Em meio às tensões entre a Índia e a China, uma estreita faixa de terra, conhecida como “Pescoço da Galinha”, surge como um ponto de vulnerabilidade para a Índia.
A disputa por esta importante região não apenas coloca em risco a integridade territorial da Índia, mas também tem possíveis implicações para a estabilidade regional e a geopolítica global.
O que é o Corredor Siliguri e qual é sua importância?
Imagine uma estreita faixa de terra, com apenas 17 km de largura em seu ponto mais estreito, que conecta uma grande região ao restante do país. Esse é o Corredor de Siliguri, frequentemente chamado de “Pescoço da Galinha”.
Esse estreito fica no estado de Bengala Ocidental, na Índia, sendo é a única ligação terrestre entre os oito estados do nordeste indiano e o resto do país, mantendo conectadas mais de 50 milhões de pessoas.
Passando por essa estreita faixa de terra, todas as rodovias e ferrovias essenciais que transportam mercadorias e pessoas fluem incessantemente, sustentando a economia e a vida cotidiana da região. Sem este corredor, o comércio de produtos do leste Índia, como o famoso chá de Darjeeling e a madeira, seria fortemente prejudicado.
Mas, além da importância comercial, o Corredor de Siliguri possui uma importância estratégica vital para a segurança territorial e nacional da Índia. É como se alguém prendesse a cabeça em meio a barras de ferro, ficando totalmente vulnerável a qualquer ameaça externa e perdendo contato com o resto do seu corpo (a parte leste da Índia). É assim que a Índia vê o Corredor de Siliguri.
Esta faixa de terra é cercada por países como Nepal, Bangladesh e Butão, e a apenas 130 km ao norte encontra-se o Vale de Chumbi, no Tibete, que é controlado pela China. A proximidade com o Tibete e a contínua construção de infraestrutura militar pela China na região elevam a tensão na área.
Desde o confronto entre tropas indianas e chinesas no Vale de Galwan em 2020, as tensões só aumentaram. A Índia, ciente da vulnerabilidade do Corredor de Siliguri, tem fortalecido sua presença militar na região.
O Corredor de Siliguri também desempenha um papel crucial na política regional. Ele ajuda a Índia a monitorar de perto as atividades chinesas no Tibete e a manter uma linha de defesa forte e preparada. A segurança do corredor é essencial também para assegurar a soberania e a integridade territorial da Índia.
O que a China está fazendo contra a Índia no Corredor Siliguri?
A China, ao longo dos anos, tem feito movimentos estratégicos que ameaçam a segurança do Corredor de Siliguri através da construção de infraestrutura militar, como estradas e pistas de pouso, e do aumento da presença militar na região do Vale de Chumbi, a China está claramente fortalecendo sua capacidade de mobilização rápida perto do “Pescoço da Galinha”.
Em junho de 2020, um confronto violento no Vale de Galwan, no território disputado de Ladakh (na região dos Himalayas mas longe do corredor de Siliguri), destacou a escalada das tensões entre os dois gigantes asiáticos. Neste incidente, muitos soldados indianos perderam a vida, e desde então, ambos os países têm intensificado sua presença militar ao longo da Linha de Controle Real (LAC), a fronteira de facto entre a Índia e a China.
As tensões entre a China e a Índia não começaram agora, mas nos meados do século XX. Em 1962, ambos os países entraram em guerra por questões fronteiriças, resultando em uma breve mas intensa guerra que terminou com uma vitória chinesa e a ocupação de partes significativas do território disputado.
Desde então, as fronteiras permanecem contestadas, especialmente em áreas como Aksai Chin (ocupada pela China, mas reivindicada pela Índia) e Arunachal Pradesh (controlada pela Índia, mas reivindicada pela China como parte do Tibete).
Por conta desse histórico, as atividades chinesas na região são vistas pela Índia como movimentos que mostram as intenções da China de manter uma posição de vantagem, aumentando a pressão sobre a Índia.
A qualquer momento, um avanço militar chinês de apenas 130 km poderia cortar completamente o corredor, isolando o nordeste da Índia do resto do país. Isso não apenas interromperia o fluxo de comércio e pessoas, mas também colocaria em risco a segurança de milhões de indianos.
Em resposta, a Índia tem reforçado suas defesas no Corredor de Siliguri, construindo novas infraestruturas militares e intensificando as patrulhas e exercícios militares na região. Este é um esforço para garantir que, mesmo diante de uma possível escalada, a Índia possa defender eficazmente essa passagem.
Além disso, novos bunkers – abrigos blindados – estão sendo construídos, terrenos estão sendo minados para prevenir ataques e soldados realizam exercícios militares regularmente. Tudo isso para garantir que, se necessário, a Índia possa responder rapidamente a qualquer provocação.
Qual é o papel do Butão na disputa pelo Corredor Siliguri?
O Butão é um pequeno reino localizado entre a China e a Índia, por isso desempenha um papel crucial na disputa pelo Corredor Siliguri. Sua posição geográfica e sua aliança com a Índia fazem do Butão um ator importante nessa disputa.
O Butão está situado ao norte do Corredor Siliguri, e qualquer movimento militar ou construção de infraestrutura por parte da China em direção ao Corredor deve, inevitavelmente, considerar o território butanês.
O Butão tem um tratado de amizade com a Índia que inclui um componente de defesa, pelo qual a Índia se compromete a auxiliar o Butão em questões de segurança.
Este tratado reforça a posição da Índia no Corredor Siliguri, já que qualquer ameaça ao Butão é vista como uma ameaça direta à Índia. Assim, a Índia mantém uma grande presença militar no país e colabora estreitamente com o governo butanês para monitorar e contrabalançar as atividades chinesas na região.
Para o Butão, manter a neutralidade e sua soberania é vital. O reino tem sido cuidadoso ao equilibrar suas relações com a China e a Índia, mas a sua segurança está fortemente ligada ao apoio indiano.
O Butão está ciente de que a expansão da infraestrutura chinesa perto de suas fronteiras representa uma ameaça não apenas para si, mas também para a segurança regional, incluindo o importante Corredor de Siliguri.
A preocupação é ainda maior devido à recente instalação de bases militares chinesas em quatro áreas estratégicas do território butanês, em uma ação contestada e ilegal, que desafia a soberania do país.
Esta movimentação tem implicações significativas para a Índia, particularmente no Corredor de Siliguri. Ademais, a China está adotando outras medidas, como o incentivo à migração de seus cidadãos para essas regiões, numa tentativa de reforçar suas reivindicações territoriais e pressionar o Butão a ceder esses territórios.
A China, por sua vez, tem tentado aumentar sua influência no Butão, propondo acordos econômicos e melhorias em infraestrutura como parte de sua iniciativa da Rota da Seda.
No entanto, esses esforços são vistos com ceticismo tanto pelo governo butanês quanto pela Índia, que teme que o Butão possa cair na “armadilha da dívida” chinesa e se tornar mais suscetível à pressão política e militar de Pequim. Dessa forma, o Butão permanece um aliado crucial para a Índia na proteção do Corredor Siliguri.
Como essa disputa é controversa para os BRICS?
A disputa entre a China e a Índia pelo Corredor Siliguri cria um dilema para o BRICS, uma aliança de cinco grandes economias emergentes composta por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
Apesar de serem membros do mesmo grupo econômico e de cooperação, as tensões bilaterais entre China e Índia desafiam a unidade e os objetivos do BRICS.
Os BRICS foram formados com a visão de promover o desenvolvimento econômico, fortalecer a cooperação política e aumentar a influência global dos países membros e contrabalancear o poder do “Ocidente” que é liderado pelos Estados Unidos.
No entanto, a rivalidade territorial entre dois de seus membros mais influentes, China e Índia, introduz uma componente que pode minar esses objetivos. Ambos os países têm buscado ativamente o crescimento econômico e a liderança regional, mas seus confrontos ao longo das fronteiras disputadas ameaçam desestabilizar essa cooperação.
Durante as cúpulas do BRICS, onde os líderes se reúnem para discutir e planejar iniciativas conjuntas, as tensões Sino-Indianas frequentemente entram nos debates.
Questões como investimentos em infraestrutura, comércio e desenvolvimento sustentável são complicadas pela desconfiança mútua e pela necessidade de cada nação defender seus interesses de segurança. A presença dessas tensões pode dificultar a formulação de políticas unificadas e a implementação de projetos colaborativos.
A Rússia, outro membro chave dos BRICS, frequentemente se vê em uma posição de mediador entre a China e a Índia, dada sua relação histórica com ambos os países.
Moscou tem um interesse estratégico em manter a coesão dentro dos BRICS e evitar que as disputas bilaterais desestabilizem a aliança. Da mesma forma, o Brasil e a África do Sul, embora menos envolvidos diretamente, têm um interesse em preservar a integridade do grupo e garantir que os conflitos regionais não prejudiquem os objetivos econômicos e políticos globais do BRICS.
No entanto, a presença de uma disputa não resolvida como a do Corredor Siliguri e as outras nos Himalayas, significa que a estabilidade do BRICS pode estar sob ameaça. Caso uma escalada militar entre a China e a Índia aconteça, é possível que a cooperação dentro do grupo possa rapidamente deteriorar, afetando investimentos, iniciativas conjuntas e a posição global dos BRICS.
Além disso, o conflito coloca uma pressão adicional sobre outros membros para tomarem partido, o que pode levar a divisões internas.
Quais são os riscos e importância geopolíticos da disputa pelo Corredor Siliguri?
A disputa pelo Corredor Siliguri apresenta riscos geopolíticos que têm implicações não apenas para a Índia e a China, mas para toda a região do sul da Ásia.
Isolamento da Região Nordeste da Índia:
– Se a China conseguir cortar ou controlar este corredor, a Índia enfrentaria a possibilidade de isolamento de seus sete estados do nordeste. Isso fragmentaria o território indiano e complicaria a logística militar e civil, tornando a defesa dessas regiões extremamente desafiadora.
Escalada Militar:
– A grande presença militar de ambos os lados na região aumenta o risco de confrontos militares diretos.
– Qualquer incidente pode rapidamente escalar para um conflito mais amplo, especialmente devido à proximidade das forças armadas.
– Dada a capacidade nuclear de ambas as nações, a escalada de um conflito convencional para um confronto nuclear é um risco preocupante, com consequências devastadoras para toda a região.
Instabilidade Regional:
– A disputa afeta diretamente as relações com países vizinhos como o Butão, que é um aliado estratégico da Índia.
– Nepal e Bangladesh, que também fazem fronteira com o Corredor Siliguri, podem ser atraídos para o conflito, seja por pressões políticas ou por alianças entre governos.
Impacto no Comércio e na Economia:
– Qualquer interrupção nesse corredor devido a conflitos pode ter impacto no comércio regional, afetando negativamente as economias locais e reduzindo as oportunidades de desenvolvimento econômico.
– A instabilidade pode diminuir investimentos estrangeiros na região.
Desafios à Soberania e à Integridade Territorial:
– A disputa pelo Corredor Siliguri coloca em jogo a soberania e a integridade territorial da Índia.
– A capacidade da Índia de proteger e manter suas fronteiras é crucial para sua segurança nacional e seu status como potência regional.
– A perda ou o comprometimento do controle sobre o Corredor Siliguri teria implicações profundas para a percepção da Índia como uma nação capaz de defender seu território contra agressões externas.
Desafios à Coesão dos BRICS:
– A polarização dentro dos BRICS pode levar a um enfraquecimento do grupo como um bloco de influência global.
– Ao mesmo tempo, um conflito entre China e India, indiretamente poderia beneficiar os Estados Unidos que vê a China e seus aliados como um rival geopolítico e econômico.
Potencial de Intervenção Internacional:
– A escalada do conflito pode atrair a atenção e a intervenção de potências internacionais, como os Estados Unidos e a Rússia, que têm interesses na região.
– A Índia mantém uma certa relação de defesa com os EUA (via o QUAD) mas ao mesmo tempo é uma tradicional compradora de armamentos Russos. Já a China possui uma aliança estratégica de conveniência com a Rússia para antagonizar os EUA e tirar proveitos econômicos.
– A intervenção de terceiros pode dificultar ainda mais a situação, transformando um conflito regional em uma crise global.
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