A análise da política energética da nações é cada vez mais pertinente devido às recentes rupturas na produção e distribuição de energia afetadas pela Guerra na Ucrânia e pela pandemia do Covid-19.
As condições climáticas também influenciam diretamente o setor energético, desde o planejamento de geração, até a manutenção dos pólos de distribuição e transmissão de energia. Isso acontece, pois na maior parte do mundo, os ativos que compõe o setor elétrico são reféns das interferências climáticas. Portanto, por menores que sejam as mudanças climáticas, elas podem impactar positiva ou negativamente as variáveis meteorológicas e, consequentemente, no planejamento e operação da energia mundial.
Nesse contexto, é possível observar esse dilema de forma mais acentuada no caso da União Europeia (UE) devido à interdependência entre diferentes Estados membros, a Rússia e à forte influência do setor nas mudanças climáticas, bem como o inverso.
É importante perceber os desafios e avanços da política energética da Europa, pois, além fator de mudança climática, ou seja, o aquecimento global, a UE está sendo prejudicada no setor energético, pois é o maior consumidor de gás natural da Rússia.
É notório que a discussão acerca da mudança climática modificou o grau de urgência em torno da questão energética e, devido à guerra na Ucrânia, a realidade da insegurança energética acabou por ganhar uma relevância ainda maior na Europa, que tem buscado fontes de energia alternativas, já que condicionou suas relações externas com a Rússia, em particular.
Portanto, Bruxelas afirma que a crise de fornecimento de energia de 2022, intensificada pela invasão russa à Ucrânia, reflete no fato de que os 27 países da União Europeia devem agir de forma acelerada para reduzir a dependência aos combustíveis fósseis.
Acesso a energia visto por perspectiva de segurança estratégica:
A empresa russa de energia Gazprom é responsável pela maior parte do fornecimento de gás natural para a União Europeia. Isso porque, segundo a legislação russa, apenas a Gazprom está autorizada a operar dutos de gás para exportação.
Segundo a rede de notícias pública da Alemanha Deutsche Welle, cerca de 43% do gás natural consumido nos países da UE vem da Rússia, o que dá ao país um grande poder de barganha ao ameaçar aumentar o preço do produto, e até mesmo diminuir o fluxo de gás para a Europa, levando em conta que grande parte dos países da UE fazem parte da OTAN, que está apoiando a Ucrânia contra a Rússia.
Essa manobra deixa o Bloco refém das políticas russas, o que compromete seriamente a sua segurança energética, reforçando a necessidade urgente de independência do abastecimento dos países afetados.
Esse impasse causa uma grande insegurança de fonte energética na Europa. Há de se levar em conta que a diversificação de matriz energética sempre foi um problema europeu já que, de acordo com a Agência Europeia do Ambiente, os combustíveis fósseis continuam a dominar a matriz energética da maioria dos países da união.
Segundo a Agência, cerca de 77% das necessidades energéticas do europeu médio são supridas com os recursos do petróleo, gás natural e do carvão. A energia nuclear supre 14% dessas necessidades, enquanto os restantes, 9%, são supridos por fontes renováveis.
Por conta disso, a União Europeia tem o objetivo de diminuir a importação de gás russo em dois terços, transformando sua matriz energética, à medida que a guerra da Rússia na Ucrânia continua a acontecer.
Um porta-voz de energia da Comissão Europeia disse à CNBC que “após a decisão unilateral anterior da Gazprom de parar de fornecer gás a vários Estados-Membros (da UE) e empresas, e com o nível abaixo da média de suas instalações de armazenamento de gás na Europa no ano passado (2021), os últimos acontecimentos nos lembram mais uma vez da falta de confiabilidade da Rússia como fornecedor de energia”.
O porta-voz também afirma que esses fatos “reforçam nossa determinação em alcançar nossos objetivos da REPowerEU de eliminar gradualmente os combustíveis fósseis russos. As sanções ao carvão e ao petróleo russos estão entrando em vigor este ano e, com o Plano REPowerEU, será acelerada a implantação de energias renováveis caseiras, reduziremos o uso de energia, mudaremos para fornecedores alternativos mais confiáveis do que a Rússia.”
Acesso a energia visto pela perspectiva econômica:
O preço da energia é um dos fatores mais relevantes na economia de um país, pois o valor pago por esse produto essencial vai ditar os preços de toda a cadeia produtiva do país.
Entende-se que o custo da energia afeta boa parte da economia nacional, como por exemplo: transportes; alimentos; afeta também a produção desses alimentos, já que o uso de tratores e outras máquinas são necessárias para a colheita.
Nesse efeito dominó, a inflação também é afetada e, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), as classes sociais mais afetadas no Brasil, por exemplo, são as classes baixas e médias em maior escala; afetando, ainda, as políticas domésticas.
Portanto, seja qual for o país afetado, os altos preços da energia são negativos e as consequências tendem a ser similares.
Tomando os Estados Unidos como exemplo, nota-se que é um país que produz mais petróleo do que ele mesmo consome. Porém, sendo o petróleo e o gás uma commodity em que o preço é regulado nos mercados internacionais, o preço vai inevitavelmente aumentar de igual maneira.
No caso do Brasil, mesmo com sua enorme produção de petróleo e a Petrobras sendo uma empresa estatal, independentemente dos esforços para se manter os preços baixos, será um vão esforço, visto que o petróleo brasileiro é cotado no mercado internacional, e em dólar.
Então, um conflito geopolítico da extensão do que está acontecendo entre a Ucrânia e a Rússia, e as sanções impostas à Rússia vem trazendo muita volatilidade ao preço do petróleo, afetando inclusive o Brasil. Sem levar em conta, ainda, a depreciação do real frente ao dólar atualmente.
Portanto, se não existir algum tipo de subsídio governamental para diminuir o preço para que estejam de acordo com os custos dos respectivos países, esse governo ficará refém do mercado internacional.
Por fim, é necessário ponderar o quão importante é para um país ter acesso a energia, mas, melhor ainda, ter acesso à energia barata.
Acesso a energia visto pela perspectiva de sustentabilidade e proteção ao meio ambiente:
Uma das discussões mais essenciais sobre o meio ambiente hoje, é como ter segurança energética e ainda assim ser sustentável.
Um país pode ter segurança energética, pode ter acesso à energia barata, mas pode ser uma energia extremamente poluente e incompatível com o bem-estar do meio ambiente.
Ter acesso à energias poluidoras, pode inclusive afetar a saúde e o bem- estar das pessoas que moram no entorno dos campos de produção, levando até mesmo a algumas doenças irreversíveis.
Então os objetivos dos países devem ser:
- O acesso fácil a energia;
- A energia deve ser barata;
- E deve ser sustentável, com poucas emissões de gases que causam o efeito estufa.
Como conciliar segurança energética com os objetivos de redução de emissões de gás de efeito estufa:
A Guerra na Ucrânia elevou a importância de conciliar o equilíbrio entre a segurança energética e com a energia “limpa”, pois nota-se que a Rússia é um dos maiores produtores de petróleo e gás do mundo.
A Rússia é um dos maiores produtores de petróleo e gás do mundo e também se tornou integrante da OPEP+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), que consiste no novo acordo entre os países da OPEP com a adição da Rússia, para conter a produção de petróleo e, assim, aumentar os preços no mercado internacional.
Portanto, a conjuntura atual tem grande influência no preço final do petróleo e, consequentemente, dos combustíveis usados em ampla escala pelo mundo inteiro.
Além do preço final, a própria distribuição dessas matrizes energéticas para a Europa são afetadas, principalmente, pois este é o principal continente dependente do petróleo e do gás russos. Durante a Pandemia do COVID-19, o preço do petróleo se manteve extremamente baixo, ao contrário de atualmente, em 2022.
– Curto prazo
A curto prazo, a necessidade é da produção de energia de forma rápida e fácil, entretanto a mais garantida e constante seria a por hidrocarbonetos.
Para isso, será necessário o investimento em infraestrutura desses combustíveis, também na produção de terminais de gás natural liquefeito (GNL), que são recebidos via navios. Podendo, assim, importar de países como a Noruega, os Estados Unidos e o Catar.
– Médio e longo prazo
No médio prazo, o investimento em energia nuclear poderá ser uma boa opção, tomando o exemplo da França.
A União Europeia definiu a energia nuclear como uma das mais limpas atualmente, apesar de conter alguns resíduos nucleares, não emite o gás carbônico ou outros gases de efeito estufa.
A partir daí, pode-se iniciar o investimento em energias sustentáveis, pois se o país tiver uma independência totalmente baseada em energias desse tipo – como, por exemplo, o hidrogênio verde – desfruta de uma maior segurança energética, que é o objetivo inicial.
Com esse tipo de energia, será possível usá-la no transporte aéreo e marítimo, onde ainda ainda não é viável eletrificar. Também pode-se fazer a eletrificação de toda a frota de automóveis e até a eletrificação do aquecimento residencial.
A futura tendência da busca do equilíbrio entre segurança energética e objetivos climáticos
O conflito na Ucrânia acelerou o investimento em energia renovável no média e longo prazo pela necessidade da Europa de se tornar independente da Rússia em termos energéticos. Porém, também aumentou o investimento do bloco em energias “sujas” no curto prazo para aumentar a sua resiliência energética.
Não somente da Rússia, mas a UE precisa da independência de importação de energia também dos países do Oriente Médio.
No início desse processo, os preços do uso de energia podem aumentar em alguns países, em comparação com o uso de combustíveis fósseis, mas no médio e longo prazo, essas mudanças serão melhores para o clima.
Um exemplo disso é a Alemanha que está reativando suas usinas de carvão, que são as mais poluentes que existem, para compensar a redução do gás russo. Deve-se levar em conta que o gás é poluente, porém não se compara ao carvão.
Em suma, cada país terá sua própria transição energética. De acordo com o que cada um pode e consegue fazer, de acordo com suas necessidades sociais.
A guerra acabou por acelerar um processo que já estava em andamento, não só na Europa mas nos Estados Unidos, e a tendência é que essa aceleração propicie melhores perspectivas para o clima no médio e longo prazo com um passo para trás no curto prazo. Portanto, no início será um processo sofrido para o meio ambiente, porém será melhor no futuro.